quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

O natal e o desaire.


Das faltas de condescendências do dia a dia já tratamos algumas vezes aqui, eu e você, leitor. Mas nos últimos tempos a necessidade de algumas pessoas (ou impotência) frente ao feriado natalino está ultrapassando as bem marcadas linhas do ridículo.


João odiava o natal desde que se conhecia pelo seu apelido, Jojo. Odiava esse apelido mais que outra coisa em sua vida, poucos o conheciam e mudava de emprego, esposa, vizinhança, gostos, onde quer que descobrissem. O apelido o perseguia, e tinha uma história natalina triste. João sempre ganhava meias e cuecas no natal, seja porque as suas estivessem sempre rasgando ou manchando, seja pelo gosto horrível dos poucos familiares que tinha. Num dos poucos natais que ganhou algo diferente (um blusão, listrado, amarelo com verde musgo) estavam presentes a família dos vizinhos com seu pequeno rebento da idade de João, inimigos declarados na rua e no colégio (gostava particularmente de atormentar nosso amigo). A avó de João dera o blusão, o fez vestir e acariciou seu cabelo dizendo: “ó Jojo (saiu naturalmente, não era costume da sua avó dar apelidos ou tratar alguém com carinho), tu ficaste muito porreta”. Nem Deus previra tamanho causo num dia de natal, o inimigo de João espalhou o apelido para todos da rua e da escola e logo João virara Jojo da vó; a situação só piorou quando a mãe de João o fez usar o blusão no primeiro dia de aula do ano seguinte. Desde então, João não conseguia mais ver o natal como uma festa de confraternização ou com qualquer outro significado relevante. Odiava o natal como odiava seu presente de natal inusitado, o apelido Jojo.


Tal estória serve como explicação de muitas aversões ao natal de variadas pessoas. Mas não serve para aquelas pessoas que dizem que o natal é brega, fede, ou é uma festa chata, sem motivo aparente. Certa vez, nesse ano conturbado, para nós, leitor, eu me flagrei defendendo o natal, pois por ele tenho muito gosto, soubesse eu quantas pedras acertariam minha nuca ao dizer isso. Hoje defendo o desaire do natal, a breguice clássica que todos conhecemos, os presentes da avó, as discussões da família, até o tio bêbado com barba de papai Noel. O natal é uma vez ao ano e todos devemos aproveitar, não levanto bandeira, vale até a festa do escritório, se não for daquelas com inúmeros atritos, pessoas desmaiando e a filha do chefe tirando a roupa na mesa. Que tal montar a árvore? Tenho especial admiração por isso, leitor, a árvore mostra muito do espírito de todos ou de uma pessoa da casa. Que tal pendurar guirlandas? Montar pisca-piscas? Que tal dar feliz natal no final das conversas pela rua ou pelo telefone, pelo mensageiro, que tal? Vamos, leitor, vamos esperar o natal e defender o nosso direito de desairar uma vez no ano, ao menos uma vez.

Um comentário:

P. Florindo disse...

Antes de comentar: que palavra mais bonita essa, Rubis, desaire. Amei. ♥

Agora meu comentário:
Sabe por que eu acho que muita gente sente repulsa pelo Natal? É porque muitas delas não tem uma família unida e todo o final de ano elas sentem-se sozinhas, deslocadas, ficando de fora daquele "Ideal de Natal" (família reunida, todo mundo feliz comendo, bebendo e celebrando, se divertindo).

Muitos usam o pretexto de que "o Natal é apenas uma data onde os comerciantes lucram horrores" para esconder essa frustração causada por Natais tristes e fora do Ideal.

Sonhei que as pessoas eram boas em um mundo de amor
E acordei nesse mundo marginal...